O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, inesperadamente, suspender
a publicação da súmula que declara a inconstitucionalidade de lei
estadual que institui incentivo fiscal e retém parcela do ICMS que
seria destinada aos municípios. O texto, aprovado na semana passada,
era aguardado por prefeituras que lutam na Justiça contra a prática,
que alimenta a guerra fiscal entre os Estados. A súmula também
serviria de munição para as cidades que travam batalha semelhante
contra a União.
A súmula, suspensa por um pedido do ministro José Antonio Dias
Toffoli, para tornar o texto mais abrangente, incentivaria outros
municípios a enfrentar a União e os Estados. "A súmula levaria
muitas cidades à Justiça", diz o advogado Fernando Facury Scaff,
sócio do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães,
Pinheiro & Scaff Advogados. Para ele, o entendimento do Supremo, se
mantido, poderá ser usado nas disputas contra o governo federal. "A
situação é idêntica. Em ambos os casos, deixou de entrar dinheiro
nos cofres públicos."
O ministro Dias Toffoli decidiu pedir a suspensão porque verificou
que há precedentes envolvendo uma outra situação, que não inclui
incentivo fiscal. Ele cita uma decisão de 2002 que declarou a
inconstitucionalidade de uma lei do Rio Grande do Sul que permitia o
pagamento de débito tributário com bens. Com a prática, o Estado
acabava retendo a parcela do ICMS pertencente aos municípios. "A
súmula nº 30 deverá abranger também essa situação", afirma.
A súmula foi aprovada com base em uma decisão proferida pelo Pleno
do Supremo. Os ministros reconheceram repercussão geral em um
recurso do governo de Santa Catarina contra o município de Timbó. A
prefeitura havia ajuizado ação contra o Estado para receber o
repasse de ICMS retido pelo Programa de Desenvolvimento da Empresa
Catarinense (Prodec). Esse programa permite o adiamento do
recolhimento do imposto por empresas que invistam no Estado.
O advogado Carlos Eduardo Serpa, que defendeu o município de Timbó,
disse que o Estado estava repassando apenas um terço do que devia.
"Com a decisão, foi fechado um acordo e o governo se comprometeu a
regularizar a situação. Mas ainda não o fez", diz. "Já estamos
executando o Estado."
O procurador-chefe da Procuradoria Fiscal de Santa Catarina,
Dagoberto Brião, explica que o Estado está readequando seu sistema
para cumprir a decisão. "A distribuição dos recursos que entram no
caixa do Estado é automática", afirma. Já o montante que o Estado
deixou de repassar está sendo pago em parcelas, segundo Brião. Para
ele, a posição do Supremo é equivocada. Os ministros entendem que,
mesmo antes do dinheiro entrar no caixa do Estado, os municípios já
têm direito aos 25% de ICMS.
As prefeituras também discutem na Justiça o repasse de IPI. Tramitam
no país pelo menos uma centena de ações contra a União. Muitas delas
favoráveis aos municípios. O advogado pernambucano Jonas de Moura
Neto, do escritório Moura & Carriço Advogados, já obteve sentenças
para os municípios de São Gonçalo do Amarante (RN), Itabi (SE) e
Vertentes (PE). Os processos usam como precedente a vitória do
município de Timbó no Supremo. As decisões determinam a devolução
dos valores não repassados nos últimos cinco anos.
Um dos primeiros processos sobre o tema que chegou ao Supremo
envolve o município alagoano de Satuba. A prefeitura questiona a
retenção e busca a regularização do repasse de 23,5% da arrecadação
de IPI ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O Tribunal
Regional Federal (TRF) da 5ª Região acatou o pedido de tutela
antecipada de Satuba. Inconformada, a Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional (PGFN) recorreu ao STF. Ao analisar a questão, o ministro
Gilmar Mendes aceitou o pedido de suspensão da tutela antecipada
"por risco de grave lesão à ordem e economia públicas". O mérito da
ação ainda não foi julgado.
De acordo com o procurador da Fazenda Nacional, Fabrício Sarmanho de
Albuquerque, as desonerações de IPI mantiveram o mercado aquecido, o
que aumentou a arrecadação e, consequentemente, o repasse aos
municípios. "Além disso, a União tem autonomia para dispor sobre
seus tributos", diz. O procurador defende ainda que a situação da
União é diferente da enfrentada em Santa Catarina. "No caso de
desoneração, o tributo nunca será arrecadado e, assim, não pode ser
repassado."
O presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), Paulo
Ziulkoski, prefere não alimentar a polêmica. Segundo ele, a entidade
não vai orientar os municípios a entrar com ações contra a União e
os Estados. Mas critica a desoneração de IPI para automóveis e linha
branca. "O Lula faz favor com nosso chapéu", afirma.
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